15.10.05

A Sede

Busquei em cada rua.
Bebi de todos os copos.
Traguei todas as fumaças.
As luzes dos postes, nas esquinas.
Parada sob a lua,
uivando e enlouquecendo,
gritando palavrões e jurando de morte.
Vendo o sangue escorrendo pela sarjeta,
indo em direção ao ninho dos ratos, num festim e tanto!
E onde está o vampiro, numa hora dessas?
Onde está a língua ávida?
Onde estão os dentes afiados e precisos?
E a sede insana, turva e desesperada...
É, é você que eu procuro.
É seu sangue que busco, na verdade,
e é ele que escorre pelas ruas,
enchendo os bueiros do meu caminho,
das minhas estradas esburacadas, que percorro sozinha.
A música pulsando alta,
ensurdecedora nos fones plugados direto no cérebro,
a desordem gritada e mantida,
misturada ao amor e à fome.
E minha caminhada em busca de você continua, incerta, incoerente.
Uma cartomante me disse que estávamos longe um do outro,
que nossos sangues não se misturariam,
que saliva e gozo não mais seriam provados,
não haveria mais alimento pra mim.
Não chorei, é certo.
Só estive faminta.
E cortei os pulsos, e sorvi o que saia dali,
e ainda não sei se era alimento, ou se era desespero.
E seu beijo, naquele dia.
E seu corpo, naquele dia que nascia cinza,
e o letreiro vermelho-neon,
e o sangue no chão, misturado à vodka.
Os tambores anunciando guerras,
e as virgens caminhando para o sacrifício,
e o hardcore pulsando dentro da minha mente
depravada e corrompida,
sempre buscando,
o dia que já foi.

Roberta Nunes
16/10/2005

1.10.05


Certo.
Ok.
Beleza.
Você venceu.
Me trouxe até aqui, e me deu seus motivos.
Não entendi bem seus argumentos, mas ouvi tudo.
Era tudo verde na minha mente, enquanto você dizia que deveria ser azul.
Eu queria flores, e você dizia que os frutos seriam melhores.
Alimento e sobrevivência...
Beleza e poesia, afinal.
E a tristeza te consumindo, numa roda-viva sem fim!
Fui te encontrar lá no parque, num dia de sol, pra te dizer que seria noite de lua cheia, e você apenas sorriu, como a gente sorri pra uma criança tola.

24.9.05

Ela caminhava.
Vinha pela rua, e tristeza resoluta no olhar.
Tinha um porte de princesa, altiva e segura, com brilho de pérola nos dentes, e orgulho estampado no sorriso, mas um quê de solidão no brilho do olho.
Não era ninguém, nada importante, nem indispensável na vida de quem quer que fosse.
Não se sentia dona de nada.
Era só, e só se mantinha, pra não doer depois, dizia.
Mas, lá no íntimo, ainda sonhava.
Queria um braço forte em torno da cintura fina, queria um beijo apaixonado, queria ser olhada como única, um tesouro, o sol.
Queria ainda sentir, sim, o peso de um homem sobre o corpo magro e bem-feito, entrelaçar as penas em pernas musculosas, emaranhar os cabelos em cabelos cacheados como os dela, e gemer junto com ele num dueto perfeito, uma vida inteira suspirada e misturada à saliva, num segundo de vida-quase-morte, em camas-terremotos.
O tempo, inimigo cruel e desumano, tirou essas coisas dela, os homens passaram por sua vida, e continuaram seus caminhos, buscando novas carnes e novas aventuras, e ela sorria seu sorriso de pérolas brilhantes, e sorria seu olhar triste.
E, assim caminhava Rita, mulher e linda, afilhada de Iemanjá, devota de grandes divindades e santas, pelas ruas de uma cidade qualquer.
Uma mulher comum, como tantas que cruzamos por aí, com seus amores e sorrisos complacentes, e cabelos ao vento, e lágrima que não escorria pelo rosto marcado pela vida, mas brotava direto da alma, do ventre, do vazio da solidão.

Roberta Nunes
25/09/2005

p.s.: Pessoal, esse texto é uma pequena experiência, num estilo diferente do meu habitual.
beijos a todos.

17.9.05

...e no princípio...

O Começo.
Pois é.
Cara, como isso é difícil!
Quer dizer, eu aqui, sendo lida por vocês.
Ok, pedante, eu sei.
Mas, é isso mesmo.
Eu vejo seus olhos ávidos, ah, sim, ávidos, exatamente como os meus ao ler neste espaço.
Lendo estas linhas, vocês procuram algo?
Emoção, talvez?
Lascívia, quem sabe?
Uma frase que lhes cause algum tipo de sensação inesperada...?
Identificação?
Pode ser.
Pode ser que eu consiga isso, é o meu objetivo, sabem?
Não existe texto, poesia, prosa-poética ou crônica, "sem pretensão".
E é ainda mais difícil falar sobre isso, já que é um assunto tão batido!
Um ponto de vista é sempre UM ponto de vista, não?
Eu escrevo há pouco tempo, embora leia desde sempre. Uma auto-didata compulsiva por leitura ( Dóris, também li muita bula de remédio e rótulo de xampu), viciada em conhecimento e amante de vários estilos literários e autores diversos.
Vocês me perguntam: o que isso tem a ver com a gente? o que isso tem a ver com seu texto de domingo n'Os Cronistas?
Nada, talvez.
Mas, acho que tudo, na verdade.
Eu achei que seria delicado começar me apresentando, dizendo quem sou e como fiquei assim.
Muito prazer, meu nome é Roberta Nunes, e postarei aqui aos domingos, faça chuva, sol, com ou sem vitórias do timão.
Um abraço a todos.
Ufa!

29.7.05

Ressaca literária

Sabem, ando com vontade de me suicidar.
Não é nada pessoal, é só cansaço.
Antes, eu tinha as letras.
Lindas, perfeitas, verdades.
Agora, não passam de lixo fantasioso e hipócrita.
Chega a ser piada!
Noventa por cento de baba-ovos de nove por cento, e um por cento que presencia essas cenas patéticas e que precisam vomitar, pra não morrerem de tédio.
Como eu vou morrer em breve, não ligo mais.
Sofro, sim, pelos pobres da fatia de um por cento, que têm suas caixas de entrada entupidas de mensagens cretinas, de propostas indecentes de degradação.
Literatura usada para inflar egos.
Literatura usada como pretexto para línguas nas botas.
Pessoas ditas inteligentes, com bons empregos, boa formação, que não se dão ao trabalho de perceber o que sua escrita pode criar, as perspectivas em mentes um pouco mais suscetíveis.
Lixo com pontuação obscenamente correta, gramática perfeita, ortografia corrigida automaticamente pelo editor de textos.
Tempos verbais irreais, cansativos e bastante comuns, infelizmente.
Tanto pra ser escrito fora da Terra dos Contos de Fadas.
Ei, você, Peter Pan cresceu. E mandou um recado: “Foda-se, e me deixe em paz.”
Tenho medo da dor, preciso encontrar um método eficaz de morte. Rápida e indolor.
Só vou lamentar os livros INCRÍVEIS que ainda não li.
O resto é lixo. Adaptações toscas de histórias fantásticas. Linguagem fantasiosa do mal. Purpurina no sangue da virgem. Romance mela-cueca para mulheres mal-amadas, mal-casadas, mal-elas-mesmas. Bichas enrustidas punhetando em frente ao espelho, olhando suas próprias caras. E escrevendo sobre isso!
Deusinhos de merda, adorados por merdinhas menores.
Talvez, eu peça para ser enterrada com os livros meu favoritos.
Sinto o gosto amargo da ressaca literária.

Roberta Nunes
28/07/2005

21.7.05

Ontem

Sorri para a lua.
Ergui meu rosto, e sorri.
Foi triste, na verdade.
Como um quadro de Rembrant.
Não havia lágrima, escorrendo.
Só na alma.
Lavada?
Não, lavada não.
Não sei pra onde foi a sujeira.
Olhei debaixo do tapete, e não achei nada.
E saí corerendo
pela noite clara.
Tinha meus livros, não tinha?
E cerveja gelada me esperando em casa.
E frase-clichê-lugar-comum variando na mente.
Terrorismo literário pulsando na minha veia pensante.
E os dias ensolarados de inverno, me permitem
óculos escuros e sobretudo e cachecol roxo.
Meus amores.
São rostos estampados na minha retina.
Cheiros que trago comigo.
Acho Rembrant muito triste.
A obra dele.
Olhares tristes e vagos.
Sorrisos pálidos.
Alguém me disse um dia que havia sol no meu sorriso.
E a noite foi assim,
perdida nos olhares pintados por Rembrant
e perdida nas linhas da minha última e derradeira paixão.
Estou cansada e gelada,
mas tenho muito pelo que brigar, ainda.
Imagino seu olhar tão perdido quanto o meu.

Roberta Nunes
21/07/2005

15.7.05

Silêncio Enxaqueca

Hoje, não quero falar.
Tenho o direito do silêncio.
A dor de cabeça me permite esse silêncio.
Na verdade, ele exige.
Nem o barulho das teclas...?
Esse, eu suporto.
Não suporto ouvir vozes, a minha voz. Mas ler, vá lá.
Quando eu era criança, li um poema infantil, chamado "O Herói Que Matara o Reizinho Inimigo". Me fazia chorar, era triste que só. Ver a gravura do soldado marchando com a medalha enorme no peito, e uma sombra no rosto. Ler sobre o reizinho que morria, chorando junto com o soldado.
Vira e mexe me lembro desse poema. Não lembro do autor, e nunca mais vi o tal livro.
Acho que não era bem um poema para crianças. Era para os adultos.
Matamos um reizinho por dia.
Matamos a pureza de nossas almas, afogamos tudo em mágoa, dizendo palavras desnecessárias e descartáveis, re-utilizadas, e re-aproveitadas de discussões anteriores. Nada de novo. Há algo de PODRE no reino da Dinamarca.
Isso me deixa triste.
Perdi um bom tempo com isso, ocupada em ser perfeita, correta, ignorante e tudo o que você sempre quis.
Boa garota. Um anjo. Vaquinha de presépio. Vaca devassa pra você, e vaca profanada pra mim.
Hoje, não quero mais.
Foda-se.
Me chame pelo meu nome, baby.
E o silêncio não vem, pois as palavras escritas ecoam em altos brados na minha mente, em ritmos punk/hardcore.
Milhares de baterias eletrônicas em potência máxima, dark wave, dark side.
Goze em mim, em alturas rarefeitas.
Me faça esquecer o tal reizinho.
Me chame de amor, se quiser.

Roberta Nunes
15/07/2005

(...
se você me vir sorrindo
no meu fusca azul
caçando uma luz amarela
guiando direto pro sol
estarei preso nas
garras de uma
vida louca.)
Charles Bukowski

13.7.05

Teoria da agressão

O quê, exatamente, nos dá o direito da agressão?
Nem adianta dizer que é o ódio, que não cola.
Seria o amor, talvez?
Claro que não, me disseram que o amor não tem que doer.
Talvez seja a impotência.
Sexual, sanitária, insanidade.
Seria o tal saco cheio?
Ou a tal arrogância, que infla egos de maneira escrota?
Ou ainda a mediocridade, nojenta...
Não acredito na agressão.
Não acredito que só se aprende no tapa, ou no grito, ou na queda.
Não poderia, nunca, confiar nesse critério.
Procuro sempre os não-significados.
Acredito em você.
Na sua verdade, mesmo que não seja uma verdade pra você.
Pelo menos, não uma verdade absoluta, macia e quente e segura, como um bom casaco que te protege.
Acredito na força do verbo.
E sei que o verbo faz sangrar mais que o corte da navalha.
Fossas de palavras mal-ditas, entupidas e transbordantes, com lindas e gordas moscas verdes/azuis.
Mas não é em você que jogo isso tudo.
Destilo minha bile assim, agredindo, sim, claro, o teclado, o fundo branco da tela, quem lê.
Não sei o quê me dá o direito da agressão, do veneno gratuíto.
E, nem sei se quero saber.
Amo-te, sempre.
E não sei como agredi-lo, não consigo e não posso.
I wanna fuck you like a animal*
Trago tudo tatuado, marcado a ferro, em letras garrafais e piscantes.
Neon vermelho.

* Closer - Nine Inch Nails

Roberta Nunes
13/07/2005

11.7.05

C.A.O.S.

Não digo 'eu te amo'.
Nunca sem motivo.Nunca sem razão.Só disse uma vez.
Lembra do Princípio?Foi só dessa vez, baby.Nunca quis.Não minto pra você.Vem, que eu agüento.Você é responsável pelo que cativa.Ou não.Eu sou escroto.Você é minha puta.Como saber?A pedra está lá, meu bem.Tudo muda no lodo.E o peso do mundo?
Não carrego todo nas costas.
Suporto só o seu peso e seu macrocosmo e seu amor.
Insólito?
Batidas de maracujá e pêssego cor de pele.
Da sua, na minha.
Boca que não cala e me exige falar.
Só beijo.
Anarquismo limpinho e cavalheiresco.
Não me odeie, só quero seu sangue no látex.
E Vênus em camisas de força.
Não tenho escolha, amor, hoje, essa sou eu.

Roberta Nunes
10/07/2005

6.7.05

Mais uma noite.
Voltei.
Fiz de você meu brinde
E te bebi num só gole
que foi escorrendo pelos cantos da boca.
Transborda.
Translúcido.
Transubstancie-se para saciar minha sede.
Vejo gotas de sangue no chão do quarto
resquícios das minhas brincadeiras...
Multi-posições
Nos espelhos

3.7.05

Comemoramos.
Bebemos.
E nada de conciliar o sono...
Chão, saliva, loucuras sussurradas para não incomodar os vizinhos.
Nada podia ser melhor, mais doce, mais intensamente insano.
Faço de você exatamente aquilo que você quer de mim.
Que a puritana se masturbe até não haver mais nada.
Pilhas de livros que me servem de travesseiro,
e seu braço pra me lembrar do calor da carne.
Pernas entrelaçadas e peso insuportavelmente leve e boca que me beija como se fosse o óbvio a fazer.
Vivi minhas letras pra isso, sempre, morta de cansaço e insuportavelmente consciente de mim mesma.
Me transformei em ondas sob seus dedos.
E vi a regidez se transformar em fluídos.
Perfeito.
Completo.
Você.

Roberta Nunes
03/07/2005

29.6.05

quero, como sempre, ver as estrelas no céu da sua boca

26.6.05

Domingo

Ontem, fui abatida em combate.
Combate verbal, literário, histórico, obsceno.
Duelo titânico.
Amei meu oponente.
Me entreguei a ele em prosa e verso.
Rimei meu corpo.
Fiz dele minha pauta.
Umedeci as roupas com palavras e promessas.
Em breve,
o combate corporal.

Roberta Nunes
26/06/2005

25.6.05

Fóssil

Enquanto caminhava pela rua, dei de cara com uma rachadura no asfalto.
E meu coração se partiu, pois eu entendi que nem tudo é perfeição.
E você, que me enchia de sol, se foi.
Colei aquele tecido balinês na janela da cozinha, pra filtrar a luz.
Me beija, amor, e marca a contra-capa da minha vida com a sua dedicada dedicatória.
Cacos de som nas ondas do meu dia-dia, e lembranças coladas com cuspe.
Amores catados na praia, e conchas jogadas aos porcos.
E vejo a rachadura aumentar e engolir minha fantasia de Batman...
Recordações de aulas de geologia, origens das rochas
e fósseis aprisionados nelas, melhor sedimentares.
Prender sua pegada na minha sala,
Seu sussurro na minha orelha eternamente rouco,
Sulcos e sucos do seu corpo pra sempre na minha cama.
Te beijo no copo de tequila, e o sal é seu.
Não, não vai demorar pra ficar bêbada, e me sacrificar aos deuses
Pra te ter aqui.
te beijo.

Roberta Nunes
25/06/2005

23.6.05

Caminhando ao sol

De sobretudo preto, e óculos escuros
Cachecol roxo para combinar com o sol do meio-dia
A música louca das rotinas
Martelando seus acordes aliens no meu walkman
Reverberando notas acústicas pelas artérias
Plugando guitarras...
Mas não é de música que falo
É de amor
Sobre o toque, e virar do avesso, e mordidas na nuca
E novamente os bandolins
Hoje o dia não está pra poesia
E acho que nem pra prosa
Sempre pra rock'n'roll
destoando de tudo o mais ao redor
E pedra que rola
pedra que havia no meio do caminho
Primitiva e sedimentar de origem qual, mesmo?
Aprisionando fósseis vivos
Selvagem, me fazendo lembrar de outros tempos
E amor incondicional, intrusivo
ígneo e absoluto
Uma música diferente, explosões misturadas às buzinas
aos gemidos e baterias eletrônicas
Música e dança e tremor de terra e avalanche e caminhões
Tarde fria

Roberta Nunes

11.6.05

Pedra

E sigo, nessa loucura de vida.
Viajo nos seus lábios, e gozo na sua saliva.
São beijos de febre, como li uma vez Álvares de Azevedo no colégio, e não te conhecia ainda!
Te tenho na pele, como uma das minhas tatuagens, a primeira.
Faço de você minha pedra fundadora: não existia nada antes.
Em delírios e beijos, e convulsões, imagino seu corpo despido, de roupa e pele, caminhando para mim, sua voz vindo, dizendo que me ama...
Despida do pudor, ouço o som das ondas, e ouço Cure, e penetro nas sombras do seu desejo.
Deixo de ser, para estar. E assim caminho.
Te dou o que não tenho, e faço o que me manda, e me ajoelho para receber seus sacros mandamentos de amor.
Seus olhos iluminam meu dia? Não sei.
Ouço bandolins no sol da manhã.
Meu amor me leva para terras loucas, onde poesia é servida no café da manhã. E Marquês de Sade no jantar!
E amo com profundidade, com totalidade.
Faço do meu útero um templo, que recebe libações e sacrifícios, e tomo no meu corpo seu corpo que é meu.
Sua língua é meu punhal, que penetra em mim com verdades que não revelo, nem assumo.
Me banho na pureza e na imperfeição do seu prazer.
Te levo comigo, seu cheiro na minha roupa, seu gosto em mim.
E, assim, caminhamos.

Roberta Nunes
10/06/2005

9.6.05

Devassa

Devassa.
Ouvi esse elogio uma vez. Entre quatro paredes. De quatro, claro.
Eu gosto de palavras pesadas naquela hora. É, na hora do enrosco, do vai-vem controlado de propósito, descontrolado em seguida.
Mas essa palavra me deixou encafifada.
O que é, exatamente, uma pessoa devassa? Será que é uma que gosta de ser chamada assim, enquanto está fazendo um boquete?
Tá, eu sei. Assunto malhado. Mas não pude evitar. Andei lendo "O retrato de Dorian Gray".
Até que ponto a devassidão, a luxúria, a busca pelo prazer podem corromper um ser humano? Quando ele ultrapassa os limites de outro ser humano, prejudicando, incitando, influenciando? Quando alicia soldados para hordas de libertinos...?
Fico confusa.
Sempre falo de amor, e prazer nas pequenas dores. Sempre falo de desejos secretos de sanguinolência e perversão. Acredito na beleza, e vivo para buscá-la, nem que seja nas sarjetas. Acho Sisters of Mercy poético. Vozes roucas falando sobre putrefação e despedidas.
E, ainda assim, acredito na pureza das almas. Acredito na sinceridade das pessoas. O mal pode ser belo , desde que seja sinceramente mau.
Me senti trespassada. Era realmente uma lança que me atravessava o corpo naquela hora. Fechei os olhos, e gozei como nunca.
D-E-V-A-S-S-A.
Cuidado.
Oscar Wilde pode ser terrivelmente venenoso, venoso, venéreo.
Plástico, sintético, ofensivo, modismo.
Foi paixão na certa.
Roberta Nunes
18/05/2005

Apolo

O cheiro do asfalto selvagem molhado, e da dama-da-noite despudorada, me trazem sua presença.
Lembro do primeiro olhar.
Você caminhando num sentido, e eu no outro. Esbarrei, derrubei seus papéis, pedi desculpas, um café no bar próximo em sinal de paz.
Um olhar.
O rubor.
Meses de amizade supostamente desinteressada.
Um dia, você me confessou sua confusão. Vi seus pelos se arrepiarem ao meu toque àspero. Desculpe, são mãos de homem...
Sentimentos atropelados, bons amigos jantando, dedos tocando de leve as pontas de outros dedos.
Nunca mais esqueci seu rosto de anjo, seus cachos perfeitos. A curva da boca ao tocar na taça, o sorriso maroto, meio de lado, dentes brancos e força de caráter estampada na cara.
Beijo forte, amor violento, um estupro consentido.
Foi sua maneira de extravasar a raiva, e chorar depois, da maneira que só homens choram, soluços vindos da alma.
Me perdoa, meu amor, mas não posso....isso doeu mais do que a violência no corpo, mais do que os dentes na carne .
Caminho pela noite. Virei sombra. Insone e bêbado.
Vejo, pela fresta na cortina, sua mulher e filhos, morenos como você, anjos.
Talvez o Deus dos Mares me deixe ficar, ou talvez os Deuses do Monte me aceitem de volta...
Não sou mais Apolo. Não tenho mais nada.

Roberta Nunes
09/06/2005

1.6.05

Tapetes da vida...

Hoje, acho que fui cruel.
Direta demais. Incisiva demais.
Ele disse adeus.
Eu disse foda-se.
Leva a porra do tapete com você.
Não tomo vinho, a garrafa virou caco na calçada do vizinho.
Prefiro conhaque. Gosto pior, ressaca pesada. Desperta os sentidos.
Acorda pra vida, cacete!
Limpar o sangue desse maldio tapete...
E as marcas do colchão.
Seu cheiro carunchado.
Pelos grudados no sabonete.
Camisetas de rock, panos de chão.
Último volume, Siouxie, baby...
Garrote na garganta,
e chuveiro pingando.
Mãe, de onde vem o trovão?
Mãe, porque o sangue é vermelho?
Seja luar, meu amor.
Espalhe-se pela noite.
Escorra pelo ralo da banheira,
e corra pelas sarjetas.

Roberta Nunes
01/06/2005

31.5.05

Boneca de Trapo

Cada detalhe.
Cada gesto.
Cada olhar.
Me lembro de tudo.
Me lembro da louça suja na pia, e dos copos sujos de vinho, dos cinzeiros cheios de guimbas. Dos restos.
Me lembro dos cheiros. De todos.
Do jantar, do desinfetante do banheiro, do perfume do seu pescoço. O cheiro de suor e de batom.
E toda a dor volta com essas lembranças. Todo o ódio.
Ainda vejo o reflexo do seu corpo no espelho do quarto, despida com a luz acesa, sem pudor. Displicente. Sensual. Arrogante.
Ainda vejo o seu corpo de gata no cio, curvilíneo, respiração ofegante, língua inquieta, saliva quente. Umidade que evapora ao toque, temperada com sangue. O gosto ainda está nos meus dedos. Íntimo. Único.
Mais um conhaque, vinho me dá enjôo.
Só um estalo rápido. Um olhar perdido. Um grito congelado.
Agora, Boneca de Trapo, você vai para o armário, se juntar às outras.

31/05/2005

Início

É isso.
Resolvi ver no que dá esse negócio de blog.
Não sei bem o que fazer aqui.
Com o tempo, bem, talvez eu descubra...