30.1.08

Poema 230

O amor é o cemitério populoso da podridão.
O leite derramado dos heróis.
Destruição de lenços de seda pela tempestade de pó.
Carícia de heróis vendados
presos nos postes.
Vítimas de assassinatos aceitas nesta vida.
Esqueletos trocando dedos e juntas.
A carne trêmula dos elefantes da gentileza
sendo despedaçada pelos abutres.
Concepções de rótulas delicadas.
Medo de ratos espalhando bactérias.
A Fria Esperança da Gólgota pela Esperança do Ouro.
Úmidas folhas de outono contra o casco dos barcos.
As delicadas imagens de cola do cavalo-marinho.
Morte por longa exposição à desonra.
Seres assustadores encantadores ocultando seu sexo.
Pedaços da essência de Buda congelados e fatiados microscopicamente
em morgues do norte.
Pômos do pênis a ponto de semear.
Mais gargantas cortadas que grãos de areia.
Como beijar minha gata na barriga.
A suavidade de nossa recompensa.

Jack Kerouac
(escrito total e completamente sob o efeito de morfina)

28.1.08

Pretty Woman

Tá, eu sei, não existe nada mais brega do que esse filme.
Pior ainda, é gostar dele.
Um continho de fadas bem sem-vergonha.
Mas, eu gosto.
E, como a mocinha Julia Eca Roberts, eu fico esperando sim, um milionário Richard The Best Gere.
Não, eu não admito isso publicamente, numa mesa de bar, por exemplo.
Só de ouvir a música do Roy Orbson já fico toda arrepiada.
E a cena do piano?
PUTA QUE O PARIU!
Droga.
Só falta agora eu contar que chorei quando assisti Cidade dos Anjos...

23.1.08

Cirurgião

Vou cutucando aqui e ali, abrindo buraquinhos com a ponta de um bisturi cego, que encontrei na sarjeta.
E vou abrindo esses buraquinhos com pinças enferrujadas, e fuçando lá dentro como faria um cirurgião-barbeiro do século XV.
A pele, deliciosamente elástica, se abrindo, lasciva, aos meus dedos curiosos e desesperados.
As coisas se acumulando nos baldes e bacias ao meu redor, folhas soltas, um pôr-do-sol, aquele dia na praia, os ruídos de uma cidade ao amanhecer, a pestilência de um sorriso cansado, a maldita prosa que insiste em ser poesia, manca e corcunda, a virgindade perdida sabe-se-lá-onde, você.
E, quanto mais eu penetro (vai, com força!) naquela podridão, os vermes também surgindo, e sem se incomodar com a minha intromissão, me convidam para o baile e, depois o banquete.
Perfeitamente!
Enquanto o fel, escorrendo das feridas abertas, empoçando no chão.
Enquanto o sangue, coagulado e talhado, feito queijo negro, prato principal dos vermezinhos gordos.
Enquanto as fezes, acumuladas há séculos, empesteiam o ar.
A puta parada ali, no canto, rindo da sujeira respingada nas paredes e teto, e dos meus braços, lambuzados até os ombros.
Seu riso desdentado e a baba verde, virulenta.
Seus olhos vazios e as meias rasgadas.
Seu ventre vazio e a alma rasgada.
A espectadora (escárnio?) dessa dissecação sacra.
Busco o prazer nesse seu ânus arregaçado, puta, já com as pregas arrebentadas pelo meu estupro contínuo.
Ah! A antiga viscosidade ainda lá, bem no fundo...
O prazer da areia entrando pelos poros.
E meu gozo lá, nos seus intestinos.
Minha porra quente bem onde você sempre gosta mais, e grita mais alto, a puta de olhos vazios.
Me passe agora, sua vadia, a linha e a agulha, pois preciso costurar os retalhos de mim mesmo, e depois beijar essa sua boca, escancarada num grito mudo e perpétuo.
E limpe essa sujeira.


Roberta Nunes
23/01/2008

18.1.08

Pústula

Ah, sim!
A pústula!
Nojenta, cheia de pus esverdeado e mau-cheiro.
Uma coisa horrível de se ver.
Uma cicatriz mal costurada que, ao menor movimento, cospe podridão.
É assim que te vejo hoje.
E percebo como é pervertido o prazer de lamber essa ferida, travestida de amor.
As formigas já invadindo nossa cama, e as moscas, ah! as moscas! tão fiéis aos cadáveres em decomposição, fazendo sinfonias ao nosso redor.
Larvas gordas e brilhantes nadando no nosso suor azedo.
Baratas cascudas limpando os cantos das nossas bocas babosas, restos de vinho e beijo.
Restos de restos.
Fios de cabelos nas fronhas imundas, cheias de manchas mitológicas.
Olho em volta e vejo a degradação: paredes descascadas e mofadas, tapetes rotos, um prato com restos de refeições debutantes.
Insetos e você.
Aranhas se fartando...
Who wants to live forever?*
Who wants to love forever?*
Não quero ser enterrado vivo num túmulo que nem é meu.
Nessa lápide, meu nome não está escrito, e as datas não correspondem ao meu mapa astral (que eu nunca fiz).
O som oco dos seus ossos descalcificados, o rangido das suas articulações!
E os livros desfolhados, jogados sobra a nossa cama, uma colcha de núpcias.
E as folhas secas das árvores do cemitério, que é nosso vizinho mais querido, invadem nosso universo de gemidos e gritos agonizantes e revirar de olhos e arrastar de correntes.
Beijo pois, pela última vez, essa boca desdentada.
E sinto, pela última vez, esse hálito morto invadir meus pulmões.

Roberta Nunes
18/01/2007



* Quem quer viver para sempre?

* Quem quer amar para sempre?

Queen - Who wants to live forever

tema do filme Highlander

17.1.08


preciso comentar???

16.1.08

Raduan

um texto.
topei com ele hoje, e não pude evitá-lo.

AÍ PELAS TRÊS DA TARDE
(para José Carlos Abbate)

Nesta sala atulhada de mesas, máquinas e papéis, onde invejáveis escreventes dividiram entre si o bom senso do mundo, aplicando-se em idéias claras apesar do ruído e do mormaço, seguros ao se pronunciarem sobre problemas que afligem o homem moderno (espécie da qual você, milenarmente cansado, talvez se sinta um tanto excluído), largue tudo de repente sob os olhares a sua volta, componha uma cara de louco quieto e perigoso, faça os gestos mais calmos quanto os tais escribas mais severos, dê um largo "ciao" ao trabalho do dia, assim como quem se despede da vida, e surpreenda pouco mais tarde, com sua presença em hora tão insólita, os que estiveram em casa ocupados na limpeza dos armários, que você não sabia antes como era conduzida. Convém não responder aos olhares interrogativos, deixando crescer, por instantes, a intensa expectativa que se instala. Mas não exagere na medida e suba sem demora ao quarto, libertando aí os pés das meias e dos sapatos, tirando a roupa do corpo como se retirasse a importância das coisas, pondo-se enfim em vestes mínimas, quem sabe até em pêlo, mas sem ferir o decoro (o seu decoro, está claro), e aceitando ao mesmo tempo, como boa verdade provisória, toda mudança de comportamento. Feito um banhista incerto, assome em seguida no trampolim do patamar e avance dois passos como se fosse beirar um salto, silenciando de vez, embaixo, o surto abafado dos comentários. Nada de grandes lances. Desça, sem pressa, degrau por degrau, sendo tolerante com o espanto (coitados!) dos pobres familiares, que cobrem a boca com a mão enquanto se comprimem ao pé da escada. Passe por eles calado, circule pela casa toda como se andasse numa praia deserta (mas sempre com a mesma cara de louco ainda não precipitado) e se achegue depois, com cuidado e ternura, junto à rede languidamente envergada entre plantas lá no terraço. Largue-se nela como quem se larga na vida, e vá ao fundo nesse mergulho: cerre as abas da rede sobre os olhos e, com um impulso do pé (já não importa em que apoio), goze a fantasia de se sentir embalado pelo mundo.

Raduan Nassar
Texto extraído do livro "Menina a caminho", Companhia das Letras - São Paulo, 1997. pág.71.

15.1.08

quem sabe um dia...

eu consiga me desligar, me desprender, me desassociar.
quebrar as correntes, e me manter distante.
indiferente.
a dor não me atingiria.
e talvez, só talvez, as coisas fossem mais sutis.

10.1.08

O Foco

Perder o foco não é algo assim tão simples.
Exige um nível de "desconcentração" alto demais.
Ok.
Você está certo.
Essa é a impressão.
Mas, no fim das contas, não é falta de foco, é só atropelo.
Urgência.
Faço isso o tempo todo.
É um problema, eu sei, não existe jeito de uma pessoa assim ser levada à sério.
Eu não ligo.
Nunca levei isso de ser levada à sério, à sério.
A vida é curta demais.
Temos muito o que viver.
5, 6, 7, 20.
Não importa.
Só quero passar a noite, e dormir no teu braço.

3.1.08

meus amigos, eu e vocês em 2008


porra!
tive que comprar um celular novo depois do natal.
e tive que fazer depilação.
e sempre menstruo em final de mês, ou quando entro num trampo novo, ou quando tenho aquele encontro com um cara legal.
não que eu esteja reclamando.
o celular é legalzinho, embora eu ainda não saiba mexer nele, a depilação só dói na hora e, depois que tive a minha filha, A-D-O-R-O menstruar, e o tal cara legal não se incomodou....
já não reclamo mais, feito velha desocupada, ou melhor, feito velha incomodada com a felicidade alheia.
e viverei assim, por opção minha:
opção: tenho poucos amigos, mas os que tenho, são meus amigos mesmo.
opção: tenho poucos problemas.
opçãp: tenho poucas pessoas pra mentir pra mim, ou pra se ocupar da minha vida.
opção: fico com a minha família, filha, pais, irmãos.
opção: meus desejos só serão compartilhados com quem quiser compartilhá-los sinceramente.
opção: as suas conquistas serão aplaudidas por mim, de todo coração.
opção: se você quiser me beijar, ponha pra tocar uma música boa, e me beije.
opção: silêncio? nunca! nem que seja só som de respiração ofegante.
opção: nunca mais sentir aquela sede terrível! da próxima vez, eu levo a cerveja...
opção: não quero me casar.
opção: vou escrever meu livro.
opção: muito, mas muito beijo na boca!
opção: um poema de Charles Bukowski

Se vai tentar
siga em frente.

Senão, nem começe!
Isso pode significar perder namoradas
esposas, família, trabalho...e talvez a cabeça.

Pode significar ficar sem comer por dias,
Pode significar congelar em um parque,
Pode significar cadeia,
Pode significar caçoadas, desolação...

A desolação é o presente
O resto é uma prova de sua paciência,do quanto realmente quis fazer
E farei, apesar do menosprezo
E será melhor que qualquer coisa que possa imaginar.

Se vai tentar,
Vá em frente.
Não há outro sentimento como este
Ficará sozinho com os Deuses
E as noites serão quentes
Levará a vida com um sorriso perfeito
É a única coisa que vale a pena.

é isso aí, pessoal...
ps: adoro essa imagem!
ela já apareceu por aqui antes, e em outros blogs também.
fala sério: é ou não é um puta pega?